“Terror no Hospital de Chamanculo”: Entre as parteiras embriagadas e o horror que a Isaura passou

 

E nós? Seguimos. Batendo palmas ao espectáculo grotesco, como quem assiste a um teatro de horrores com entrada gratuita, onde se paga apenas com o corpo, com o sangue, com a dignidade. As nossas irmãs, nossas mães ali sofreram. Chamanculo foi o palco mais recente. Lá, onde a vida deveria nascer com honra, improvisaram-se partos como quem improvisa churrasco no quintal.

Ali, os cordões umbilicais são cortados com tesouras enferrujadas da negligência. Sem esterilização. Sem técnica. Sem respeito. Sem valor a vida, nem um pouco.

Chamanculo não é excepção, é espelho. Espelho de um sistema onde batas brancas escondem maus-tratos. Onde centros de saúde se tornam centros de tortura silenciosa.

Enquanto isso, o Ministério da Saúde repara a nota. Aquela com a promessa de averiguar a situação. O verbo que mascara o abandono total aos oprimidos em Moçambique. Porque aqui, no nosso país, parto virou performance, dor virou rotina e desleixo virou política pública.

Isaura? Isaura foi costurada da vagina até ao ânus, sem anestesia. Como se conserta um tapete velho, uma lona rasgada ou mesmo um chinelo, lençol, epa. Entretanto, a Isaura carrega no corpo os pontos da humilhação, as cicatrizes do abandono, a dor institucionalizada. E ainda ouviu as parteiras a dizerem nos corredores que mulheres da idade dela só dão trabalho. Trabalho? Quem dá trabalho é um Estado que assina atestados de óbito da dignidade em nome da austeridade.

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